quarta-feira, 27 de janeiro de 2010

GANHEI!

- Par:
- Ímpar.

- Ganhei!

- Ímpar:
- Par. Ganhei de novo!
- rrr...
- Não fique nervoso, amor! É só uma brincadeira.

...

- Poxa, 17 vezes... a última, ta?
- Ímpar:
- Par!

Perdeu. Levantou e espancou a mulher

quinta-feira, 21 de janeiro de 2010

O Coração Parou

- O coração parou...
- Socorre, um médico, um médico.
- Ele está ficando roxo?
- Então não é coração, é o pulmão.
- O pulmão parou...
- Socorre, um médico, um médico.
- Pulmões não param, seu idiota.
- Socorre, um médico...

E foram essas as últimas palavras que escutou. Estranhou. Há muito tempo não escutava voz humana. Acho que por isso aguentou ainda mais 5 minutos. Já havia desfalecido. A boca arreganhada com os dentes todos a mostra, a língua enterrada na garganta. Os músculos todos contraídos. Não se entregou facilmente à morte. Grande apreço pela vida? ainda acredito que tentava identificar aquele emaranhado de sons nem tão novos que pudesse ser indiferente e nem tão comum que não provocasse a curiosidade. Identificou, mas não se identificou. Por isso, brevemente as feições foram se tornando plácidas, traquilas. Os olhos duros, voltados para trás, como a buscar alguma coisa bela, a alma talvez. Mas já sem desespero, calmos. Não havia mais nada que temer.

Há muito tempo não temia nada. Não temia nem sentia nada. Há muito tempo muita coisa. E a mecânica do corpo foi perdendo sua funcionalidade.Os braços não serviam mesmo para muita coisa. Dedos, olhos, nariz. Pêlos e pele já não eriçavam mais. Vibrações sonoras não invadiam mais os ouvidos. Alguns ruídos - repetitivos sons de máquinas, sem contraste, sem sentido - o acompanhavam. A boca, comer, o mínimo; falar, absolutamente nada. O cérebro, massa cinzenta. O estômago se acostumou a trabalhar em silêncio, não reclamava mais a falta de alimento. Do mesmo modo o coração. Trabalhava letárgico. Foi perdendo a violência das batidas, o ritmo. Batia tão sem vontade de bater que o sangue deslizava lento pelo corpo. Nas veias, chegava a esfriar. E como não sentia nada, não sentiu aquele momento chegando, se apossando, tomando conta do que restava de sua existência.

Quando, já entregue, recebeu aquele ataque de sons humanos, o emaranhado de vozes conseguiu transpor uma barreira naquele corpo. O invadiu. E percorreu vibrante. Os olhos abriram ainda uma vez. O coração enternecido voltou à violência. Duas, três vezes. Fez com que o corpo recebesse uma enxurrada de sangue novo e quente. Ainda sem entender o que eram aquelas ondas frenéticas pulsando em si, a mente pensou: vale a pena?

- Como os pulmões não param?
- O coração parou?
- Deus, que miserável.

Não.

- Parou.